(*) Maira Uez
Imagine a seguinte oferta de trabalho: escala de seis dias de trabalho por uma de descanso, com folgas flutuantes e, não raras vezes, necessidade de trabalhar aos finais de semana e feriados.
Você aceitaria?
Se esse anúncio tivesse sido feito 20 anos atrás não causaria tanto espanto. Afinal, o mercado de trabalho segue a lei da oferta e da demanda de mão de obra. Hoje a história já é outra, os profissionais buscam o que a hotelaria sempre ofereceu para seus clientes: diversão, qualidade de vida, experiências e aprendizado.
A hotelaria sempre teve seu charme, concorda? Ambiente elegante, divertido ou de alto padrão, com acesso a instalações de primeira linha, como piscinas, spas e restaurantes. Além disso, a possibilidade de viajar e trabalhar em várias cidades. É verdade que chega a ser glamouroso, mas também é um trabalho desafiador e exigente. Afinal a hospitalidade é uma indústria que funciona 24 horas por dia, sete dias por semana. Ou seja, não para nunca.
Embora a hotelaria seja um setor importante para a economia do País, de modo geral, e para a indústria do turismo, em particular, sofre há muito tempo com a atração e retenção de mão de obra qualificada, sendo esse um dos desafios históricos enfrentados pelas empresas hoteleiras.
É preciso aceitar: a pandemia mudou a forma de trabalho no mundo e não foi diferente na hotelaria. Na Atrio, a exemplo do que ocorreu em outras empresas do nosso setor e de vários outros segmentos econômicos, tivemos que tomar decisões difíceis para garantir a continuidade dos negócios quando todos os hotéis foram fechados. A maior delas, sem dúvida, foi a demissão de 1/3 do quadro de funcionários em poucos dias.
Durante esse tempo de incertezas, empresas e profissionais tiveram que se reinventar. As pessoas acabaram migrando para outros setores onde era possível trabalhar de maneira remota, abriram seus próprios negócios, e muitos mudaram seu estilo de vida. Falamos pouco sobre isso, mas o fato é que a pandemia se confirmou um grande período de reflexão para a sociedade. Hoje ponderamos sobre propósito, sobre ter um trabalho que gere valor para a sociedade, sobre ter mais tempo livre, sobre qualidade de vida e sobre vida de qualidade.
E a hotelaria como ficou nessa história? O setor foi tão afetado durante a pandemia que, na retomada dos negócios, adotou uma postura lenta e conservadora no que se refere aos investimentos em gestão de pessoas. Receita certa para aumento do turnover.
Enquanto a hotelaria sofre com o apagão de mão de obra e demora para reagir, outros setores estão contratando. Esse momento de dificuldade também é um convite a reinvenção. Leitor, lembre-se que há 20 anos era comum encontrar um ascensorista no elevador? Pois é... Hoje, essa posição praticamente não existe mais.
Por aqui, adotamos uma postura ativa para unir tecnologia e hospitalidade. Gradualmente, estamos tirando foco de atividades com pouco valor agregado, repetitivo e sem propósito, utilizando a tecnologia a favor do negócio, dos funcionários e dos clientes. Esse assunto é tão importante na companhia que criamos uma área de inovação, a HospTech.
Estamos em uma corrida contra o tempo quando falamos de gestão de pessoas: no último ano, atualizamos todas as nossas políticas, organizamos cargos e salários fazendo reajustes espontâneos em 60% dos hotéis (e o trabalho continua), criamos o Programa UAU (um atendimento único, que busca melhorar os indicadores de qualidade dos hotéis e remunerar semestralmente os funcionários pelas metas atingidas).
Para além de tudo isso, temos trabalhado na formação e treinamento de nossos líderes, mudamos a forma e tempo de reconhecimento das pessoas. Há pouco tempo, lançamos o Programa BE Atrio que une ações para o bem-estar físico, psicológico e financeiro dos líderes. Nos hotéis, já revitalizamos 40% dos espaços de descanso e refeitório, temos calendário fixo para comemorar e aproximar as pessoas, como o Dia da Família, por exemplo.
O fato é que são inúmeros os desafios na atração e retenção de talentos e a área de recursos humanos das empresas hoteleiras precisa começar a fazer o que nunca foi feito: questionar as velhas práticas, olhar para o futuro, ser digital e tecnológica, ser autônoma e não automática apenas. Ela deve também propor e participar dos assuntos que são estratégicos.
Para nós, há uma máxima usada com frequência: “o futuro foi ontem”. Ela nos dá a sensação de que estamos atrasados, fizemos muito e ainda há muito a ser feito. Nosso lugar é o desconforto que oferece conforto aos nossos hóspedes.
(*) Maira Uez é Coordenadora de Recursos Humanos na Atrio Hotel Management, empresa responsável pela geração de cerca de 2,6 mil empregos diretos em todo o Brasil
0 Comentários